Forrest Gump: O Contador de Histórias (1994)

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Abertura: O Ponto de Ônibus e a Pena
O filme se abre em 1981 com uma pena que flutua ao vento e pousa em um ponto de ônibus em Savannah, Geórgia. Ali, sentado em um banco, Forrest Gump narra sua vida a estranhos que vão se sentando para ouvi-lo. A pena funciona como motivo visual do acaso e do destino — algo que atravessa toda a narrativa. A estrutura do filme alterna esse relato no presente com longos flashbacks que contam a trajetória de Forrest desde a infância na pequena cidade fictícia de Greenbow, Alabama até o início dos anos 1980. 

Infância em Greenbow: A Mãe, os Frentes e o Bracelete
Forrest nasce com um leve atraso cognitivo e uma coluna torta; ainda menino é obrigado a usar órteses nas pernas (os “braces”), o que o transforma em alvo de bullying. Sua mãe — a Sra. Gump — cria Forrest sozinha, administra uma pensão em casa e repete conselhos com frases simples e diretas (“Mamãe sempre dizia: a vida é como uma caixa de bombons…”), que virariam bordão. Entre os inquilinos da pensão aparece um jovem Elvis Presley (tal como referenciado no filme), que se inspira nos movimentos de dança de Forrest. O contraste entre a ingenuidade de Forrest e as duras lições da vida é estabelecido já nessa fase. 

A Garotinha Jenny: Amizade e Escapismo
Na escola Forrest faz amizade com Jenny Curran, menina problemática e de família complicada; Jenny será, ao longo do filme, o grande amor de Forrest e o contraponto: enquanto Forrest vive de forma inocente e linear, Jenny foge dos traumas por caminhos autodestrutivos. A relação deles é simples e profunda — ele a protege, ela o inspira, e os encontros e desencontros ao longo das décadas movem grande parte da trama emocional.

A Quebra das Ortesses e a Velocidade - A Corrida que Mudou Tudo
Um episódio decisivo da infância é quando Forrest foge de valentões; suas órteses quebram e, livre, ele descobre ser extraordinariamente rápido. Esse “dom” de correr abre portas: Forrest ganha uma bolsa de futebol americano universitário. A cena da corrida simbólica (e depois a sequência muito longa de Forrest a correr na vida adulta) é tratada pelo filme quase como metáfora do impulso que o personagem tem de simplesmente seguir em frente. 

Futebol Universitário, Bear Bryant e a Casa Branca
Forrest estuda com bolsa de futebol na Universidade do Alabama; lá ele é apadrinhado pelo técnico Bear Bryant. Em meio a jogos e ao sucesso como retornador de chutes, o filme insere Forrest na história americana: ele presencia o episódio conhecido como “Stand in the Schoolhouse Door” do governador George Wallace e, num pequeno gesto, ajuda a devolver um livro a Vivian Malone Jones, uma estudante que lutou pela integração — uma dessas passagens que mostram Forrest perdido nos grandes acontecimentos, mas sempre presente. Em função do desempenho esportivo, Forrest acaba participando de uma visita à Casa Branca e conhece o presidente John F. Kennedy. 

O Exército, Bubba e a Guerra do Vietnã
Depois da universidade Forrest é convocado ao Exército (meados dos anos 1960). Em treinamento ele faz amizade com Benjamin Buford “Bubba” Blue, que sonha trabalhar com camarões, e com o tenente Dan Taylor (mais tarde chamado Tenente Dan). Em 1967 a unidade de Forrest serve no delta do Mekong; numa emboscada muitas mortes ocorrem: Bubba morre em combate e Forrest salva diversos companheiros feridos — inclusive o Tenente Dan, que sofre consequências físicas profundas. Pelo seu heroísmo, Forrest recebe a Medalha de Honra, entregue a ele pelo presidente Lyndon B. Johnson — outra grande cena em que a vida singular de Forrest cruza com o palco da história.

Volta para Casa, a Marcha ao Pentágono e o Encontro com Jenny
De volta aos Estados Unidos, Forrest participa sem maior compreensão política de eventos marcantes: está presente na Marcha contra a Guerra (o filme o coloca em presença de ativistas como Abbie Hoffman) e reencontra Jenny, que agora vive com o movimento hippie. Jenny e Forrest têm encontros intermitentes: ela é atraída por protestos, drogas e rock’n’roll; ele, por sua lealdade singela. Em um hospital militar, Forrest descobre aptidão para o ping-pong (técnica que aprendeu durante sua recuperação) e se transforma num fenômeno do esporte — participando de uma campanha de “ping-pong diplomacy” que o leva à China, onde, em sequência editada com imagens de arquivo, ele chega a aparecer em programas de televisão e até a cruzar cenários com nomes famosos da época. 

Ping-Pong, Nixon e o Escândalo Watergate
A fama do ping-pong abre portas improváveis: Forrest ganha status público, viaja com times e aparece em programas. O roteiro brinca com o inserir de Forrest em cenas de arquivo — por exemplo, cenas em que aparece ao lado de John Lennon numa entrevista televisiva. Mais adiante, a montanha de coincidências do personagem o leva a cruzar com Richard Nixon; numa sequência curiosa Forrest obtém um quarto no Watergate Hotel e, sem entender o que presencia, chama a polícia sobre estranhos no local — o que, ficcionalmente no filme, contribui para a descoberta do escândalo Watergate. O filme utiliza esses encontros para satirizar e brincar com a ideia de que uma pessoa simples pode, sem querer, atravessar os grandes eventos da política.

O camarão, o huracão e a Bubba Gump Shrimp Company
Forrest lembra de sua promessa a Bubba e, com o dinheiro ganho em aparições e patrocínios, compra um barco de pesca em Bayou La Batre para cumprir o desejo de entrar no negócio de camarões. Ele leva o Tenente Dan com ele; Dan, inicialmente amargo e ressentido por ter perdido as pernas, mais tarde encontra um novo rumo. O ponto de virada financeiro ocorre quando o barco de Forrest e Dan é o único sobrevivente do furacão Carmen — o que, junto com decisões de Dan (mais tarde), resulta na criação da Bubba Gump Shrimp Company. Uma observação curiosa do roteiro: investimentos alimentados por Dan e por sorte (no filme, menção a um investimento em Apple Computer) transformam a empresa em grande sucesso e fazem Forrest milionário, embora ele permaneça essencialmente a mesma pessoa altruísta de sempre. 

A morte da mãe, o retorno de Jenny e o Casamento
Forrest volta para o Alabama para cuidar da mãe; ela morre de câncer, e sua morte é sequência emocionalmente forte. Em 1976 Jenny volta a procurar Forrest: ela passou por anos de abuso, drogas e exploração — detalhes do passado de Jenny são mostrados em flashes que explicam suas escolhas autodestrutivas. Quando Jenny volta, eles se reaproximam; Forrest, ingenuamente, propõe casamento. Jenny o aceita, eles têm relações e, na manhã seguinte, ela parte novamente. Desolado, Forrest quebra e decide correr sem destino. Ele corre por três anos pelos Estados Unidos, reunindo seguidores e se tornando um símbolo público — mas a corrida acaba como gesto de cura pessoal: ele simplesmente para. 

O Filho, a Doença e o Adeus Final
Em 1981 Forrest recebe uma carta de Jenny: ela voltou e quer que ele a visite. Ela apresenta um filho, Forrest Gump Jr., cuja paternidade é de Forrest. Jenny revela estar doente de um mal incurável (o filme insinua que se trata de uma doença sexualmente transmissível relacionada à epidemia de HIV/AIDS do período) e, após um breve período de convivência em que se casam, ela morre. Forrest fica responsável pelo filho; no final do filme ele o deixa no primeiro dia de escola, e a pena do início volta a flutuar, fechando o ciclo e ressinalizando a incerteza da vida.
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